sábado, 5 de julho de 2014

ditado

imprime
uma partitura fina
numa via subcutânea qualquer,
tão logo te atina
prepara o açúcar, a dose, a colher
a gente combina;
eu tenho pressa, você pede um café
a égua empina,
o galo fica de pé
se não te vejo,
mando um telegrama
tento via express
do amor a gente não fala
a gente reza e tem fé.




quarta-feira, 24 de abril de 2013

Nesse buraco da parede tem um lagarto, né mamãe?
Sim, ele é verde com listras vermelhas, sua lingua enrola, enrola
enrola e desenrola... Ele se mudou há pouco tempo pra esse buraco,
vamos avisar que estamos passando e que ele pode passar lá em casa,
não queremos mais aquele bolo de tapioca com côco, ele pode
se interessar...
Não, mamãe, ele come polvo. Puxa, tinha me esquecido.
Tô demais esquecida, depois que você dorme lembro de escrever
alguma coisa, mas esqueço. Fico sem texto, chego a duvidar que um
dia era eu mesma autora de lirismos, delírio.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

perspicaz

vôo
águia-de-cabeça-branca
olho certeiro, asa, bico, presa, chão
o cotidiano me chama
feito almoço pronto de criança
são dez mais cento e mil
tributos, torneios, tradiçao,
tempo.
cansado, mas atento
o pássaro repara: falta o til
estou ficando velha.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

armadilha

é mesmo quando vejo o céu
verso limpo e aberto
prova de sanidade,
o escuro ofusca e me empurra


cá estou eu na dobra do papel.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

cabeça de vento

quando o pouso em própria casa é arriscado.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

sobre a burrice

A mesa alí, imóvel.

Até hoje não entendi porque os móveis da sala
ou de qualquer aposento não são móveis,
estão aí, pra ocupar um espaço,
um corpo parado que vai ficando senil.

A mesa repete sua existência no tempo
e os anos passam...

Eu nunca entendi
(ou talvez não me lembre
minha memória é ruim à beça)
onde é que as histórias ficam?

Hoje, quando passei pela sala,
a mesa estava lá, com suas gavetas,
vez ou outra ouço dedos estalando sobre ela
soando lentos, firmes.

Os dedos sim, são tiranos, eles dizem "sua porta,"
mas sem volume.

Eu, quando vejo, finjo que não ouço e pronto.

domingo, 29 de maio de 2011

invasão

Quanto tempo !

Um abraço, um beijo,
uma ternurinha sem graça - faz tempo que não me vejo.
São meses fiando, uma concentração absurda,
só há fios pra mim há meses:

vermelho, rosa, verde e branco
vermelho, rosa, verde e branco
vermelho, rosa, verde e branco
sempre nessa ordem.

Eu poderia dizer industrial, nessa ordem industrial,
mas estaria te enganando.

O fazer pode ser mecânico,
execução de dedo num tempo exato:
puxa amarra, vai !

Faz-se um laço, dois, três, mil
laços de qualidade afetiva,
em série: puxa amarra puxa amarra,

que dia é hoje?
Somando ontem, hoje, mais amanhã,
dá uma totalidade de horas a fio,
puxando e amarrando
continuamente, exatamente,
minto:
tenho dúvidas, me perco,
ai, maldita lacuna !
vem cheia de saudade,
faz tempo que não me vejo.